terça-feira, 5 de abril de 2011

Descaracterização irreversível





Por:Pedro Galego



Alentejo: Moradores da vila dizem-se “chocados”

Castelo de Marvão com obra polémica

As obras de requalificação do castelo de Marvão estão a causar polémica. A intervenção arquitectónica nos edifícios do interior da fortificação e a instalação de um sistema de videovigilância são vistas por alguns moradores como um "atentado ao património".


Luiza Assis, habitante da vila alentejana, diz estar "chocada" com um projecto que "põe em causa a herança histórica e a preservação do castelo, até agora imaculado, onde não era necessária qualquer intervenção". As obras incluem a construção de uma nova calçada, que, segundo a habitante, "pode destruir um pouco de calçada medieval existente, e que está intacta".

"Vão instalar câmaras num local de profunda tranquilidade e sem crimes de qualquer espécie e, como se não bastasse, abrem buracos no penhasco granítico para construir bancos. Seria mais barato e menos destruidor bancos tradicionais de madeira", defende Luiza Assis.

Já Victor Frutuoso, presidente da autarquia, explica que "tudo foi feito segundo as normas", e que em diversas reuniões abertas à população "ninguém questionou ou apresentou propostas para alterar o projecto". "Confio no Igespar e na Direcção Regional de Cultura, que aprovaram o projecto, e não é legítimo, agora que as obras estão a decorrer, dizerem que não gostam."

"Até foi feito um levantamento arqueológico, para o caso de se fazer algum achado que merecesse a interrupção ou não realização das obras, e isso seria respeitado", diz o presidente, "surpreendido" com as críticas aos trabalhos, apoiados pela comissão que acompanha a candidatura de Marvão a Património Mundial da Humanidade.

9 comentários:

Tiago Pereira disse...

Comentário curto e directo:

Primeiro – este projecto foi alvo de discussão pública. Eu lembro-me bem dessa reunião, que aconteceu sensivelmente há dois anos. Quem é que nessa altura levantou cabelo? Os mesmos de sempre… Agora vimos chorar para os jornais, tudo bem! Mas as acções de contestação têm de acontecer no local, têm de ser organizadas, têm de ter argumentação, e mais importante que tudo isto – têm de ter quem dê a cara. E isso meus amigos não acontece há muito em Marvão, são muito poucos aqueles que dão a cara em prol daquilo que acreditam, e por isso mesmo Marvão (Vila e Concelho) está como está!

Segundo e último – este projecto é mesmo para inglês ver e para dar sustento a meia dúzia de pessoas! Mas o MAIS grave é que Marvão não será o mesmo depois destas intervenções. Aquilo que tinha de cru passa a estilo Disney, aquilo que tinha de único passa a vulgar.

Saudações Marvanenses

João, disse...

Mais um comentário curto.

Duas perguntas e uma afirmação:

Perguntas:

A comissão de acompanhamento da Candidatura de Marvão a Património Mundial já existia quando foi feito este Projecto?

E se não concordasse desfaziam-se as Obras?

Afirmação:

Estas Obras são as de maiores custos do Município para este mandato. Estão orçamentadas em 1,3 milhões de euros, sendo que 200.000 euros são provenientes de empréstimos bancários, isto é, endividamento a pagar pelos marvanenses no futuro

Ligia CasaNova disse...

Apenas para reflexão...
O Castelo de Marvão merece-nos um respeito muito especial.Mas principalmente neste caso, não deve ser utilizado de forma banal... E como sabemos qualquer intervenção no Património gera polémica. Reabilitar,requalificar, tornar universalmente acessível, proteger são intervenções necessárias que não me chocam. O que me choca mesmo é a nossa tendência(portuguesa)de opinarmos todos como sábios... o que me choca sim é pensar que em Santo António das Areias existe um Hotel (por acaso até recebe muitos dos turistas estrangeiros que vêem visitar o Castelo de Marvão)e desde que reabriu (2007)já apresentou desculpas aos hóspedes
por não terem água para tomar banho ou não poderem jantar no restaurante: 5 por rupturas de água na Av. de Abril e uma média de 3 falhas anuais de energia eléctrica. E com isto não pretendo criticar todos os executivos camarários desde Abril...Será justo no sec. XXI?
Para ultrapassarmos estes "obstáculos" necessitamos mesmo muito da Candidatura a Património e do Castelo...Actual e apetecível para ser visitado e vivido pelas gerações vindouras...Não será um modo de preservar as memórias?
No post seguinte deixo um texto do arq. Ricardo Carvalho de 2001 para reflectir...

Ligia CasaNova disse...

Palácio da Pena: Antes e Depois em Simultâneo
Depois da Segunda Guerra Mundial, e com o Movimento Moderno já moribundo, pelo menos na Europa, actualizam-se as inquietações relacionadas com a intervenção no património arquitectónico. A polémica oitocentista levantada por John Ruskin e Viollet-le-Duc, da conservação versus restauro, é estilhaçada pelo trabalho de síntese, crítico e experimental, de Carlo Scarpa. Este Italiano trabalhou, durante seis anos, de 1957 a 1963, no "restauro" do castelo medieval de Verona, dito o Castelvechio. Com esta obra assume o tempo como algo que contamina os espaços e os materiais, logo as pessoas, e interfere no "monumento" com uma expressão contemporânea, com o pretexto de o transformar em museu. Nos espaços do Castelvechio nenhum tempo é mais digno que outro, ao contrário daquilo em que acreditavam as ditaduras, que selecionavam a história que melhor lhes servia. E porque património são as pessoas, Scarpa estabeleçe um itinerário museológico onde estátuas e respectivos plintos assaltam o percurso, obrigando-nos a um olhar não passivo perante o registo da história. Até mesmo a estátua emblemática da cidade - o cavaleiro ca grande - foi colocada no exterior sobre um elemento em betão armado. Pensava-se ter sido o golpe de misericórdia no pitoresco.
Mas o que pode ligar o Castelvechio ao Palácio da Pena em Sintra? A intervenção de Fernando Salvador e Margarida Grácio Nunes, arquitectos de uma geração formada depois da elaboração da Carta de Veneza (1966), e herdeiros indirectos de alguns conceitos acerca do património trabalhados por Carlo Scarpa. A memória e a novidade orquestradas como um todo. O projecto da recuperação e adaptação dos espaços do edifício romântico mandado construir por D. Fernando, arrancou em 1989 a convite do IPPAR. Este consiste, basicamente, na transformação do edifício das cocheiras em refeitório e instalação de pessoal, no piso inferior; em bilheteira, loja e bengaleiro, no piso térreo e em restaurante no primeiro piso. E ainda na instalação de uma cafetaria no espaço da antiga ucharia, levando ao terraço uma esplanada. Numa segunda fase estes espaços foram equipados com mobiliário, dos mesmos autores, e numa terceira fase (não executada) seria realizada a sinaléctica de um percurso interno. O que se pedia afinal era um novo modo de habitar parte do monumento.
........................cont.

Ligia CasaNova disse...

........cont.

A intervenção vive da dialéctica entre dois universos. Escala e matéria. Os elementos introduzidos no espaço, que integram as novas infra-estruturas, recusam a escala ligeiramente distorcida do Palácio, com as abóbodas a arrancarem a menos de1.80m, para convocarem uma nova ordem de relações associadas a usos e percursos. O peso da matéria desta intervenção, que contudo não recusa a sua eventual efemeridade, assenta em materiais nobres e à vista. A kâmbala do cubo da loja, o elemento mais sedutor no seu sistema de abertura e fecho, irá naturalmente escurecendo com o tempo enquanto o Pau-Santo do mobiliário permanecerá com uma leitura semelhante. O cobre das prateleiras do restaurante é uma referência à cúpula, e as cores dos rebocos, assumem-se como prolongamentos das cores originais do palácio, especialmente o vermelho e o azul. O recurso sistemático a estes materiais permite reconhecer a intervenção como um gesto que persegue a unidade, ainda que o projecto se disperse pelo edifício consoante as suas funções.

Ao introduzirem uma nova leitura espacial e matérica no edifício, a partir dos novos usos, os arquitectos abstêm-se de rupturas. Pelo contrário, este trabalho pode ser visto como uma intervenção concentrada no essencial, apesar da sua força plástica. Veja-se a apropriação quase irónica dos elementos verticais de escadas, rótulas entre corpos do projecto original, onde se faz apenas a transposição de um desenho de Pedro Proença, artista convidado para a equipa, para um corrimão. Ou ainda a modelação espacial do restaurante através de caixas de luz - biombos -com desenhos do mesmo artista, permitindo várias experiências de espaço devido à mobilidade de algumas peças. E o tratamento da luz artificial, quase sempre derivada das novas intervenções, como que para as soltar da estrutura original. É de facto a estrutura original, pela sua qualidade, que se assume como ponto de partida e, principalmente o ponto de chegada. Qualquer coisa como um receptor de acontecimentos, capaz de continuar a acolher pessoas. Com a sua atmosfera iniciática, perfeitamente instalado na paisagem, o Palácio da Pena foi algo diacrónico, característica hoje tantas vezes temida, que encontrou a sua sincronia. E até se tornou monumento.

Até há pouco tempo foi possível visitar o Palácio com as obras de Rui Chafes. Estas apropriavam-se dos jardins e do edifício como um todo, mostrando-nos que nem só a arquitectura reclama novas leituras acerca do espaço, construído ou não construído, e dos seus conteúdos. O que possibilita algum optimismo no que diz respeito ao tratamento da memória do nosso património. Uma memória que possa integrar o devir. Novalis, poeta romântico, não o poderia ter descrito melhor: "Toda a realidade tem um antes e um depois - ambos são possibilidades. Depois é possibilidade. Antes era possibilidade. Na realidade, porém, tudo existe simultaneamente."

Texto escrito por Ricardo Carvalho para o jornal Público, suplemento Mil-Folhas, 10 de Fevereiro 2001.

Nuno Vaz da Silva disse...

Eu não conheço o projecto nem o processo de aprovação mas, por vezes, é melhor não fazer do que fazer mal!

Clarimundo Lança disse...

Eu concordo plenamente com a remodelação....
Aqueles canhões logo á entrada estão obsoletos, ali ficava de morte umas anti-aereas, na cisterna também tão desactualizada, ficava de sonho um SPA com massagens e aplicações de produtos naturais marca "MARVÂO", nas guaritas então era de gritos umas portagens electrónicas agora tão em voga, e assim sucessivamente até se modernizar este MARVÂO tão antiquado, que até parece da Idade Média. Antiquados, Velhos do Restelo, daaaaa.
Clarimundo Lança

Clarimundo Lança disse...

Vamos ver é se os "Residentes Fora" gostam?

Pedro disse...

Parabéns senhores do igespar e presidente da câmara (dirijo-me a v.s ex.as em letra minúscula porque minúscula parece ser a vossa noção de cultura Histórica).
Infelizmente continuam a desvirtuar o nosso Património com toda a impunidade.
Costumo visitar Marvão mas não volto a colocar aí os pés. Os senhores continuam não só a ofender as populações locais como todo o povo Português que tem orgulho no seu património.
Por isso não merecem o nosso respeito.
Um dia destes deitam abaixo os castelos para construirem centros comerciais e vivendas de luxo.
E senhor presidente, há autarcas que nem para varredores de rua servem.