Há dias procurei aqui divulgar os “Virgem Suta”, através de 2 temas que me pareciam dos mais sonantes destes nossos “patrícios” de Beja: “As danças de balcão” e o “tomo conta desta tua casa”.
Logo aqui se levantaram argumentos, dizendo que… sim senhor, que eram bons temas, mas que um dos melhores, e, até o preferido de alguns visitantes, seria “a mula da agonia”.
Francamente, confesso que, ou por pouca atenção, ou por audição apressada, a coisa me havia passado desapercebida, mas logo fiquei com o bichinho em mente, e lá fui à sua procura, caindo-me rapidamente no goto.
A partir daí, foram audições contínuas e sucessivas, e chego a acordar a meio da noite, com o raio da melodia na cabeça, mas principalmente o poema, do qual já fiz pelo menos 3 possíveis interpretações.
- Primeiro, pareceu-me que era uma canção de revolta dos trabalhadores oprimidos por chefes déspotas, tipo “americanado”, que têm apenas em mente o alcançar de “objectivos” manhosos, sem qualquer respeito por aqueles que produzem, sem respeito pelas mais elementares regras de organização do trabalho, tipo século XIX;
- Depois, passou a parecer-me uma “música de intervenção”, incitando contra uma classe política dominante. E, aqui há dias, num jantar em que participava, cheguei mesmo a pensar dedicá-la a um certo “cavaleiro tortulhano”, com a finalidade de o incentivar a assumir o “chicote”.
Mas não o fiz, talvez ainda precisasse de amadurecer mais algum tempo nos meus ouvidos, ou quem sabe, talvez, precisasse de o dedicar a mim próprio!
- Por fim, alguém me sugeriu, que a dita poderia não passar de uma simples canção de “vida quotidiana” de relações domésticas mal resolvidas, estimulando os oprimidos a não se encolherem nas suas “cadeiras de escravatura dos tempos modernos”, e a lutarem pela LIBERDADE e IGUALDADE.
A verdade é que este tema poderá ser tudo isto, e muitas outras coisas…
Fica pois aqui, para vossa reflexão o poema e…, já agora a música.
Abre a boca de cansada
A mula da agonia
Chicoteia as costas magras
O homem da estrebaria
Não dá asas ao descanso
Com o chicote levantado
Estimula a ponta do nó
Aos gritos como um tarado
Dá-lhe um coice minha besta
Está na hora de mudar
Agarra tu no chicote
E começa a avançar
Não te encolhas na cadeira
À espera do que há-de vir
A cabeça desta mula
Pode algum dia servir
A mula assustada encolhe-se
E trabalha até doer
Sem coragem para lutar
Só lhe resta obedecer
Pobre bicho judiado
Por quem o pôs a render
Algum dia fica jeito
E apanha um coice a valer…